FRANCISCO TROPA
APROXIMANDO PESSOAS CRIATIVAS
PORTA33 — 02.11.2002 — 31.01.2003
Transcrição livre da intervenção de João Fernandes

Poemas citados

Boa tarde. Estamos aqui numa situação de algum embaraço. O artista convida-nos para participar numa situação. E é uma situação que é característica de um trabalho que é, por si mesmo, um guiador de situações. Um trabalho que tenho acompanhado e que sempre me criou desafios entre os quais este de estar aqui convosco a partilhar algumas leituras e algumas palavras, procurando aproximar-me de uma conferência-objecto, uma conferência que faz parte da própria situação em que nos encontramos, juntos, aproximando pessoas criativas para utilizarmos um dos textos existentes nesta exposição, ou procurando fazer uma leitura-improviso em que me vou socorrer de textos meus, escritos anteriormente sobre o trabalho do Francisco, em que me vou socorrer das palavras que, pelo facto de estar convosco podem não surgir e em que me vou socorrer de textos de um escritor que gosto de partilhar com todos quantos conheço: Francis Ponge do qual tenho alguns textos que suponho podem ser úteis para a situação em que nos encontramos.

Esta situação de embaraço parte sempre de uma questão de percepção. E o embaraço começa por ser um problema de focagem que de uma percepção. E todo o trabalho que o Francisco tem criado ao longo destes últimos anos, confronta-nos com situações de percepção em relação a objectos, em relação a materiais, em relação a espaços.

Confronto esse que não é propriamente um confronto difícil mas chama-nos a atenção para a elementaridade das coisas que existem para além daquilo que podemos dizer sobre elas. E daí, digamos, o primeiro desafio, e o primeiro paradoxo de estar aqui convosco a ... porque há palavras sobre coisas que sabemos que ficam sempre aquém ou além daquilo que as palavras possam dizer sobre elas. O que, no entanto, não é uma impossibilidade é, pelo contrário, um desafio, uma tentativa. E, se as palavras são sons, esta conferência vai surgir também como um sistema de sons, como um objecto numa situação espaço-temporal onde eu me encontro, aqui, rodeado de todos vós, rodeado pelos sons que todos nós ouvimos, rodeado pelos eventos que acontecem. Um evento diz-se que é algo que acontece num intervalo de tempo, num espaço preciso. É essa precisamente a situação em que nos encontramos: um evento que tem uma duração de um intervalo de tempo que nós podemos decidir continuar, ou num antes, em que nós situemos leituras passadas, memórias que nos possam vir à cabeça, ou num depois, com aquilo que possa perdurar no facto de estarmos aqui em coincidência. Dum fragmento ou dum intervalo de tempo que nos possa reunir aqui, eu gostava de chamar à atenção para alguns dos segmentos que encontramos da visita à exposição que temos agora ocasião de ver. Fragmentos ou segmentos de linhas, linhas que se convertem em linhagens, uma linha que pode deixar de ser uma evi- dência física para passar a ser uma memória ou uma história. A palavra linhagem é bastante interessante pelo facto de precisamente corresponder àquilo que, em francês, às vezes chamam un mot valise uma palavra-mala, onde nós podemos meter o antes ou o depois dessa mesma linha, e sabemos que as linhas não acabam, as linhas só acabam aparentemente pelos muros de um espaço, pelos limites de uma folha de papel, mas que podem imediatamente continuar tal como existem no mundo em que nós vivemos.

As linhas são de algum modo categorizações da realidade e quando nós lhes chamamos linhas são muitas vezes categorizações empobrecedoras de uma realidade. Por isso mesmo o facto de encontrarmos nesta exposição várias linhas. Uma poderá ser uma linha vertical com uma garrafa que se cola e que vibra e que nos traz a nota de um mi, outras poderão ser linhas que interceptam cantos no espaço e que nos reenviam para o além desse espaço ou para o aquém desse espaço — continua o antes e o depois — daquilo que é um campo. E o que é um campo? É precisamente o sítio onde duas linhas acabam por coincidir. Linhas que estabelecem coincidências que nós vemos pelas sombras precisamente projectadas a partir do canto no qual se instalam. E daí as linhagens que nós encontramos: a linhagem do crânio ou a linhagem do olho. A linha transforma-se numa linha temporal quando falamos de linhagem. É como uma suspensão. Uma suspensão, muitas vezes, esta era uma palavra utilizada nas farmácias para a preparação de receitas: mistura-se um pigmento ou mistura-se um medicamento numa solução como se uma suspensão apontasse para uma solução. A solução temos nós que a encontrar da forma como possamos procurar o princípio e o fim de cada linha de que nós incutimos existir um princípio ou um fim mesmo que saibamos que eles não são encontráveis.

Na obra do Francisco Tropa, a percepção é sempre uma chamada de atenção à necessidade de nos descentrarmos de nós para o conhecimento dos objectos por si e a linhagem, neste caso, vai ser a confluência de tudo quanto há para além de nós, de tudo o que não fazemos parte, como se nós fossemos nós de um baraço que sabemos sem princípio nem fim. Por outro lado, encontramos na exposição que aqui visitamos objectos suspensos: uma laranja poderá ser a metáfora de um crânio, ou uma laranja poderá ser a forma de um planeta? Há algo de modelo de planeta numa laranja suspensa. E um poeta, Eluard, disse em tempos que a Terra era redonda como uma laranja azul. Por outro lado, a azeitona sabemos que é um conceito que faz parte de uma história de uma palavra chamada Mediterrâneo e é um conceito que mirra, enquanto mirra de azeite, enquanto fogo de um Mediterrâneo que é sempre memória e história de um sol e de um mar.

Uma laranja e uma azeitona juntas suspensas numa linha, numa linhagem espaço-temporal são também o confronto com uma escala. E um confronto também com a circulação a que elas convidam pelo facto de elas próprias rodarem em torno do eixo que as suspende. Assim como nós rodamos em torno dos objectos presentes nesta exposição, assim como vocês entram em translação em relação a mim ou eu entro em rotação em relação a vocês a partir da situação física e temporal em que nos encontramos.

Temos nesta exposição, também projecções de desenhos, de desenhos a que podemos chamar “cubos”.

Cubos que em si rodam e que nos colocam precisamente sobre esta questão do que há para além de nós quando rodamos em torno deles ou quando eles rodam numa rotação.

A rotação e a translação são dois conceitos operativos da obra do Francisco Tropa e são dois conceitos que nos devem alertar para o que é uma ilusão centrípeta da nossa condição no espaço. Os espaços não existem em função de nós mas os espaços existem porque nós neles nos movimentamos. E melhor os conheceremos se tivermos a disponibilidade e a generosidade para os descobrirmos independentemente de nós.

Por outro lado, a esta ilusão centrípeta, nós poderíamos contrapor uma espécie de sabedoria centrífuga precisamente como um equilíbrio entre a noite e o dia de que somos o eclipse ou a sombra. As sombras que encontramos nestas salas: as sombras de um cubo que roda, as sombras de uma laranja, as sombras de um ângulo num canto, numa esquina do espaço.

Tudo isto me leva a textos que em tempos li e que sempre, por motivos nem sempre evidentes, aliei à obra do Francisco. Francis Ponge escreveu um primeiro livro de poemas que se intitulava O PARTIDO TOMADO PELAS COISAS. E Francis Ponge alertava no partido tomado pelas coisas para o facto de as coisas poderem tomar partido independentemente de nós, para o facto de ser necessário, por vezes, nós esquecermos as palavras pelas quais nomeamos as coisas para conseguirmos criar outras situações de interpretação das coisas que nos rodeiam.

Ponge escreveu sobre coisas muito, muito simples e escreveu sobre coisas muito, muito complexas. Mas não há complexidade sem simplicidade e a criação ou aquilo a que os gregos chamavam poética é precisamente um exercício subtil de tradução de qualquer complexidade em simplicidade. Dizia Ponge que o objecto é a poética e com isso citava a frase de um amigo seu, George Braque, um dos primeiros aventureiros cubistas do início do século. Dizia Ponge que:

“A relação do Homem com o objecto não é de todo apenas de posse ou de uso. Não, seria demasiado simples. É muito pior.
Os objectos estão fora da alma, é certo; contudo, eles são também os fusíveis do nosso juízo. Trata-se de uma relação no acusativo.”

No acusativo que é precisamente essa voz que no latim ou que no grego nos leva para fora de nós, nos leva para alguém com quem falamos. As palavras que precisávamos de declinar para estar com alguém e para as fazer chegar a alguém. As palavras dirigidas precisamente a alguém.
Continua, Ponge, dizendo que:

“O homem é um corpo esquisito, que não tem o centro de gravidade em si mesmo.
A nossa alma é transitiva. Precisa de um objecto que a afecte, como seu complemento directo, imediatamente. Trata-se da relação mais grave (de modo algum da ordem do ter mas do ser ).
O artista, mais que qualquer outro homem, recebe esse encargo, acusa o golpe.”

O golpe de que Ponge nos fala é o golpe que qualquer de nós pode sentir perante uma situação que envolve o ver, que envolve a percepção que ao ver se encontra associada, mas que envolve a evidência das coisas do mundo em que nos encontramos. A evidência das coisas de que Ponge dizia em relação a uma laranja, por exemplo, se tratava de uma consciência amarga. Uma consciência amarga em relação ao tomar partido perante a evidência que um objecto possa ser. Dizia Ponge que:

“… não é um dizer que baste sobre a laranja o ter lembrado a sua particular maneira de perfumar o ar e de deliciar o seu carrasco. É preciso pôr o acento na coloração gloriosa do líquido que daí resulta, e que melhor do que o sumo de limão obriga a laringe a abrir-se largamente para a prolação da palavra como para a ingestão do líquido, sem nenhuma careta apreensiva por dentro da boca, uma vez que ele não faz com que as papilas se arrepiem.
Além disso, fica-se sem palavras para confessar a admiração que merece o invólucro deste terno, frágil e róseo balão oval nesse espesso mata-borrão húmido cuja epiderme extremamente fina mas muito pigmentada, acerbamente sápida, é suficientemente rugosa para prender dignamente a luz na per- feita forma do fruto.”

Esta é uma aproximação possível a uma laranja. Tão possível quanto aquelas que todos nós encontramos perante uma laranja suspensa no espaço que visitamos, em equilíbrio a partir do eixo de equilíbrio igualmente de uma azeitona.

Dizia Ponge ainda, que quando falamos da arte ou dos artistas, necessitamos por vezes, de procurar palavras e que através das palavras procuramos descrever as qualidades dos objectos. Mas, alertava Ponge: aquilo que se pode conceber bem pode-se enunciar claramente, mas só o que não se pode conceber bem merece ser dito, merece ser desejado e convida-nos à sua concepção ao mesmo tempo que é expressão que disso fazemos. Tudo isto, parecendo muito abstracto pode ser extremamente concreto. A vida é feita de coisas concretas, os objectos são coisas concretas e a nossa relação com eles também. Mas a partir da mais simples das evidências, toda uma ética da nossa relação com o Mundo pode ser despertada. É o que acontece com um dos mais maravilhosos textos que Ponge escreveu, um texto sobre o que é a concha.

“Uma concha é uma coisa pequena, mas posso desmesurá-la recolocando-a onde a encontrei, poisada na extensão da areia. Porque então apanharei um punhado de areia e observarei o pouco que me fica na mão depois de quase todo esse punhado me ter fugido pelos interstícios dos dedos, observarei alguns grãos, a seguir cada um deles, e nenhum desse grãos de areia nesse momento me continuará a aparecer como uma coisa pequena, e em breve a concha formal, essa concha de ostra ou essa tiara bastarda, ou esse “canivete”, impressionar-me-á como um monumento enorme, ao mesmo tempo colossal e precioso, algo como o templo de Angkor, Saint-Maclou, ou as Pirâmides, com uma significação muito mais estranha que esses demasiado incontestáveis produtos de homens.
Se então me vier ao espírito que esta concha, que uma onda do mar pode sem dúvida recobrir, é habitada por um animal, se eu acrescentar um animal a essa concha imaginando-a recolocada sob alguns centímetros de água, deixo-vos a pensar quanto crescerá, se intensificará de novo a minha impressão, e se tornará diferente daquela que pode produzir o mais notável dos monumentos que há pouco evocava!

Os monumentos do homem parecem-se com pedaços do seu esqueleto ou de um qualquer esqueleto, com grandes ossos descarnados: não evocam nenhum habitante do seu tamanho. As mais enormes das catedrais apenas deixam sair uma multidão informe de formigas, e mesmo a vivenda, o mais sumptuoso dos castelos feitos para um só homem são ainda melhor comparáveis a uma colmeia ou a um formigueiro de numerosos compartimentos do que a uma concha. Quando o senhor sai da sua morada faz seguramente menos impressão do que quando o crustácio deixa aperceber a sua mon- struosa pinça à entrada do soberbo corneto que o alberga.
Eu posso divertir-me a considerar Roma ou Nimes como o esqueleto esparso, aqui a tíbia, ali o crânio, de uma antiga cidade viva, de um antigo ser vivo, mas então preciso de imaginar um enorme colosso de carne e osso, que com efeito não corresponde a nada do que se pode razoavelmente inferir daquilo que nos ensinaram, mesmo com o auxílio de expressões no singular, como sendo o Povo Romano, ou a Folia Provençal.
Como gostaria que um dia me deixassem entrever que um tal colosso existiu realmente, que alimentassem de algum modo a visão bastante espectral e puramente abstracta que sem nenhuma convicção dele construo. Que me levassem a tocar as suas faces, a forma do seu braço e o modo como o trazia ao longo do seu corpo.

Temos tudo isso com a concha: estamos com ela em carne e osso, não deixamos a natureza: o molusco ou o crustáceo aí estão presentes. Daí, uma espécie de inquietação que decuplica o nosso prazer.

Não sei porquê mas desejaria que o homem, em vez desses enormes monumentos que apenas testemunham a desproporção grotesca da sua imagina- ção e do seu corpo (ou então dos seus ignóbeis costumes sociais, corporativos), em vez mesmo de essas estátuas à sua escala ou ligeiramente maio- res (penso no David de Miguel Ângelo) que não são senão simples representações de si, esculpisse umas espécies de nichos, de conchas do seu tamanho, de coisas muito diferentes da sua forma de molusco mas contudo a ela proporcionadas ( … ), que o homem pusesse o seu cuidado em criar para as gera- ções uma morada não muito mais corpulenta que o seu corpo, que todas as suas imaginações e razões aí estivessem compreendidas, que ele usasse o seu génio para o ajustamento e não para a desproporção, — ou, pelo menos, que o génio reconhecesse em si os limites do corpo que o suporta.
E eu nem admiro aqueles como Faraó que mandam executar por uma multidão monumentos para um só: eu preferia que ele tivese empregue essa multi- dão numa obra não mais volumosa ou não muito mais volumosa que o seu próprio corpo, — ou — o que ainda seria mais meritório, que ele tivesse dado testemunho da sua superioridade sobre os outros homens pelo carácter da sua obra própria.
Deste ponto de vista admiro sobretudo certos escritores ou músicos contidos, Bach, Rameau, Malherbe, Horácio, Mallarmé —, os escritores acima de todos os outros porque o seu monumento é feito da verdadeira secreção comum do molusco homem, da coisa mais proporcionada e condicionada ao seu corpo, e entretanto a mais diferente que se possa conceber da sua forma: quero dizer a PALAVRA.”

A palavra é algo com que nos podemos tentar aproximar dos objectos. A palavra é no entanto, sabemos sempre, uma libertação que nos deixa aquém desses mesmos objectos. Dizia eu há alguns anos atrás, num texto que escrevi sobre o Francisco Tropa que os seus projectos têm constituído situações em processo resultantes de experiências cuja descrição terá a intensidade da percepção que o resume ao momento ou ao intervalo de tempo da sua apre- sentação. A percepção transforma-se neles, na manifestação de um estado das coisas ou de um evento produzido pelo artista, na circunscrição de um espaço e de um tempo definidos pela situação que os formula enquanto hipótese, ao contrário do que sucede na ciência a hipótese não é, no entanto, jamais confirmável ou infirmável pela experiência. A relação entre ambas é de contiguidade, procedendo-se ou sucedendo-se reciprocamente num processo cujos resultados se tornam irrelevantes, sem sentido outro que não o conjunto de percepções experienciáveis. Qualquer conclusão se torna assim desnecessária. Como se a pretensão de um resultado se convertesse num exercício de redundância, a elipse do resultado converte-se então, na manifestação da economia e elegância de cada projecto. A interpretação surge como o excesso, como a manifestação de uma desatenção ao desenrolar de um evento ou como a manifestação de um estado de coisas. É desta manifestação do estado de coisas que vários projectos do Francisco Tropa se assumem na condição de observatórios. Observatórios que são outros tantos desafios à nossa capacidade de observar ou tão só chamadas de atenção ao recentrarmos perante aquilo que existe no mundo para ser visto independentemente de ser nomeado, independentemente de ser traído pela palavra ou pela experiência, apenas pela generosidade de descobrir se aquilo que … aquilo que, como cada coisa nos oferece no seu modo de usar. Observar passa a constituir então, um exercício de abandono de si mesmo sem o qual a desatenção se revela impossibilitadora de qualquer percepção do que acontece. Observar somente é o desafio que aqui se repete quando nos encontramos aproximando pessoas criativas, todos nós somos, a convite do Francisco Tropa. Obrigado.

L’OBJET, C’EST LA POÉTIQUE

Le rapport de l’homme à l’objet n’est du tout seulement de possession ou d’usage. Non, ce serait trop simple. C’est bien pire. Les objets sont en dehors de l’âme, bien sûr; pourtant, ils sont aussi notre plomb dans la tête.
Il s’agit d’un rapport à l’accusatif.

L’homme est un drôle de corps, qui n’a pas son centre de gravité en lui-même.
Notre âme est transitive. Il lui faut un objet, qui l’affecte, comme son complément direct, aussitôt. Il s’agit du rapport le plus grave (non du tout de l’avoir, mais de l’être).
L’artiste, plus que tout autre homme, en reçoit la charge, accuse le coup. (...)

L’ORANGE (...)

Mais ce n’est pas assez avoir dit de l’orange que d’avoir rappelé sa façon particulière de parfumer l’air et de réjouir son bourreau. Il faut mettre l’accent sur la coloration glorieuse du liquide qui en résulte, et qui, mieux que le jus de citron, oblige le larynx à s’ouvrir largement pour la prononciation du mot comme pour l’ingestion du liquide, sans aucune moue appréhensive de l’avant-bouche dont il ne fait pas se hérisser les papilles.

Et l’on demeure au reste sans paroles pour avouer l’admiration que mérite l’enveloppe du tendre, fragile et rose ballon ovale dans cet épais tampon-buvard humide dont l’épiderme extrêmement mince mais très pigmenté, acerbement sapide, est juste assez rugueux pour accrocher dignement la lumière sur la parfaite forme du fruit. (...)

 

NOTES POUR UN COQUILLAGE

Un coquillage est une petite chose, mais je peux la démesurer en la replaçant où je la trouve, posée sur l’étendue du sable. Car alors je prendrai une poignée de sable et j’observerai le peu qui me reste dans la main après que par les interstices de mes doigts presque toute la poignée aura filé, j’observerai quelques grains, puis chaque grain, et auncun de ces grains de sable à ce moment ne m’apparaîtra plus une petite chose, et bientôt le coquillage formel, cette coquille d’huître ou cette tiare bâtarde, ou ce “couteau”, m’impressionnera comme un énorme monument, en même temps colossal et précieux, quelque chose comme le temple d’Angkor, Saint-Maclou, ou les Pyramides, avec une signification beaucoup plus étrange que ces trop incontestables produits d’hommes. Si alors il me vient à l’esprit que ce coquillage, qu’une lame de la mer peut sans doute recouvrir, est habité par une bête, si j’ajoute une bête à ce coquillage en l’imaginant replacé sous quelques centimètres d’eau, je vous laisse à penser de combien s’accroîtra, s’intensifiera de nouveau mon impression, et devi- endra différente de celle que peut produire le plus remarquable des monuments que j’évoquais tout à l’heure!

Les monuments de l’homme ressemblent aux morceaux de son squelette ou de n’importe quel squelette, à des grands os décharnés: ils n’évoquent aucun habitant à leur taille. Les cathédrales les plus énormes ne laissent sortir qu’une foule informe de fourmis, et même la villa, le châteaux le plus somptueux faits pour un seul homme sont encore plutôt comparables à une ruche ou à une fourmilière à compartiments nombreux, qu’à un coquillage. Quand le sei- gneur sort de sa demeure il fait certes moins d’impression que lorsque le bernard-l’hermite laisse apercevoir sa monstrueuse pince à l’embouchure du superbe cornet qui l’héberge.
Je puis me plaire à considérer Rome, ou Nîmes, comme le squelette épars, ici le tibia, là le crâne d’une ancienne ville vivante, d’un ancien vivant, mais alors il me faut imaginer un énorme colosse en chair et en os, qui ne correspond vraiment à rien de ce qu’on peut raisonnablement inférer de ce qu’on nous a appris, même à la faveur d’expressions au singulier, comme le Peuple Romain, ou la Foule Provençale.
Que j’aimerais qu’un jour l’on me fasse entrevoir qu’un tel colosse a réellement existé, qu’on nourisse en quelque sorte la question très fantomatique et uniquement abstraite sans aucune conviction que je m’en forme! Qu’on me fasse toucher ses joues, la forme de son bras et comme il le posait le long de son corps.
Nous avons tout cela avec le coquillage: nous sommes avec lui en pleine chair, nous ne quittons pas la nature: le mollusque ou le crustacé sont là présents. D’où, une sorte d’inquiétude qui décuple notre plaisir.

Je ne sais pourquoi je souhaiterais que l’homme, au lieu de ces énormes monuments qui ne témoignent que de la disproportion grostesque de son imagi- nation et de son corps (ou alors de ses ignobles moeurs sociales, compagniales), au lieu encore de ces statues à son échelle ou légèrement plus grandes (je pense au David de Michel-Ange) qui n’en sont que de simples représentations, sculpte des espèces de niches, de coquilles à sa taille, des choses très différentes de sa forme de mollusque mais cependant y proportionnées (les cahutes nègres me satisfont assez de ce point de vue), que l’homme mette son soin à se créer aux générations une demeure pas beaucoup plus grosse que son corps, que toutes ses imaginations, ses raisons soient là comprises, qu’il emploie son génie à l’ajustement, non à la disproportion, — ou, tout au moins, que le génie se reconnaisse les bornes du corps qui le supporte.
Et je n’admire même pas ceux comme Pharaon qui font exécuter par une multitude des monuments pour un seul: j’aurais voulu qu’il employât cette multitude à une œuvre pas plus grosse ou pas beaucoup plus grosse que son propre corps, — ou — ce qui aurait été plus méritoire encore, qu’il témoignât de sa supériorité sur les autres hommes par le caractère de son œuvre propre.
De ce point de vue j’admire surtout certains écrivains ou musiciens mesurés, Bach, Rameau, Malherbe, Horace, Mallarmé —, les écrivains par-dessus tous les autres parce que leur monument est fait de la véritable sécrétion commune du mollusque homme, de la chose la plus proportionnée et conditionnée à son corps, et cependant la plus différente de sa forme que l’on puisse concevoir: je veux dire la PAROLE. (...)

ALGUNS POEMAS
AUTOR:
Francis Ponge
PUBLICAÇÃO:
Lisboa: Livros Cotovia, 1996
NOTAS:
Selecção, tradução e introdução de Manuel Gusmão
Contém fotografia e bibliografia de Francis Ponge
Edição bilingue
Contém desenho de Braque para a edição original